O Superior Tribunal de Justiça (STJ) proibiu, nesta terça-feira (5/6), a apreensão de um passaporte para cobrança de um débito em uma execução de título extrajudicial. A 4ª Turma do tribunal superior considerou, por unanimidade, que a medida foi coercitiva, ilegal e arbitrária por restringir desproporcionalmente o direito de ir e vir, garantido ao devedor pela Constituição.
O colegiado tomou a decisão no Recurso em Habeas Corpus (RHC) nº 97.876, apresentado por um homem que devia cerca de R$ 16,9 mil em um contrato de prestação de serviços educacionais. A escola pediu judicialmente a suspensão do passaporte e da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) do devedor porque ele não pagou a dívida, nem ofereceu os bens à penhora. Como a 3ª Vara Cível da Comarca de Sumaré deferiu a solicitação, o homem pediu que o STJ determine a devolução de ambos os documentos, argumentando que a apreensão viola o direito constitucional de ir e vir.
O relator do caso na Corte, ministro Luis Felipe Salomão, considerou a suspensão do passaporte neste processo como uma coação ilegal, mas ressaltou que o entendimento pode variar de caso a caso. Segundo o magistrado, a utilização de medidas como a apreensão do passaporte se justificaria quando os demais meios de cobrança se mostrarem ineficazes.
“Pelo que pude apurar, só houve um bloqueio no Bacenjud. Não encontrei a busca de bens ou outras medidas de cunho coercitivo”, afirmou durante o julgamento. O Bacenjud é um sistema eletrônico de relacionamento entre o Judiciário e os bancos, que possibilita bloqueio de valores a pedido da Justiça.
Nesta ação de cobrança de duplicata, Salomão entendeu que a determinação judicial para apreensão do passaporte não apresentou os motivos que fundamentassem a grave restrição ao princípio constitucional da liberdade de locomoção.
“É que objetivos pragmáticos, por mais legítimos que sejam, tal qual a busca pela efetividade [da cobrança], não podem atropelar o devido processo constitucional e, menos ainda, desconsiderar direitos e liberdades previstos na Carta Maior”
Apesar de determinar a devolução do passaporte, a turma não conheceu a parte do recurso que se referia à carteira de habilitação. Por unanimidade, os ministros entenderam que a suspensão da CNH não ofende o direito de ir e vir do devedor, porque a liberdade de se deslocar permanece, ainda que a pessoa não possa conduzir um automóvel.
“O detentor da habilitação segue com capacidade de ir e vir para qualquer lugar, desde que não o faça como condutor do veículo. Entender de forma diferente significa dizer que quem não detém CNH estaria constrangido em sua locomoção”
Apreensão de passaporte no novo CPC
A discussão decorre do artigo 139 do Novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015) que permite ao juiz aplicar “todas as medidas” que assegurem o cumprimento da ordem judicial e “determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial”.
Com base no dispositivo, credores passaram a requerer a suspensão de Carteiras Nacionais de Habilitação (CNHs), passaportes e até créditos de programas como o Nota Fiscal Paulista de devedores.
A discussão também está no Supremo Tribunal Federal (STF) em uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5.941) proposta pelo Partido dos Trabalhadores (PT) em maio deste ano.
No caso, o partido pede a inconstitucionalidade do inciso IV do artigo 139 do Novo CPC, e que, portanto, seria inconstitucional também medidas coercitivas em relação ao devedor tais como a apreensão de CNH, a apreensão de passaporte, a proibição de participação em concurso público e a proibição de participação em licitação pública.
O caso está sob relatoria do ministro Luiz Fux.
No STJ
Não foi a primeira vez que o STJ analisou o tema. A ministra Maria Isabel Gallotti manteve a suspensão da CNH do ex-senador Valmir Amaral, do DF, que não havia pago uma dívida com um fundo de investimentos. Na época, a suspensão foi justificada como meio de incentivar o cumprimento da obrigação e que a suspensão da habilitação do ex-senador “não restringe seu direito de locomoção”.
Em outro processo, um advogado de São Paulo não conseguiu liberar a sua CNH suspensa por uma dívida cobrada na Justiça, já que para o relator do caso, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, o habeas corpus não pode ser utilizado como substitutivo de recurso próprio.
“Há julgados no âmbito do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a imposição da medida cautelar de suspensão do direito de dirigir veículo automotor, não tem o condão, por si só, de caracterizar ofensa ou ameaça à liberdade de locomoção do paciente, razão pela qual não é cabível o manejo do habeas corpus”, afirmou o relator do caso, ministro Paulo de Tarso Sanseverino.
Fonte: JOTA
Fonte: Salari Advogados
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Sócio-fundador do escritório Salari Advogados; delegado de prerrogativas e membro do Comitê de Celeridade Processual da OAB/RJ; especialista em Direito Público e Privado pela Cândido Mendes; advogado colunista e convidado da rádio Bandeirantes – Bandnews; membro efetivo e convidado do programa de rádio e websérie Direitos e Deveres; colunista e especialista em Direito, convidado dos jornais O Globo e Extra.